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Faria Lima condiciona juros a compromisso de Lula com ajuste, dando gás ao presidente


| Por: Leopoldo Vieira |

Sem uma sinalização do presidente Luiz Inácio Lula da Silva quanto a um ajuste fiscal duro a partir de 2027, caso reeleito, o ritmo e a duração da trajetória de queda dos juros deverão ser limitados, sob o peso adicional de uma inflação decorrente da volatilidade, sobretudo cambial, já esperada na disputa pelo Palácio do Planalto. Discretamente, esse alerta foi emitido ao comando do Banco Central (BC) por agentes econômicos da Faria Lima — cuja expectativa inicial era de um “rali Tarcísio”. No entanto, não é o efeito econômico direto do ciclo baixista, como na atividade ou no crédito, que deve favorecer o presidente, mas o impacto político-eleitoral de um “clima” de queda dos juros no País, mantido o contexto de crescimento, emprego e renda — além da agitação de pautas populares como o fim da escala 6x1, que deve ganhar impulso com Guilherme Boulos na Secretaria-Geral da Presidência.

Sobre este novo cenário no mercado financeiro, escrevemos em 28 de agosto de 2025: "As previsões de mercado apontam também a política como vetor de valorização da bolsa brasileira e de queda do dólar e dos juros, com o eventual avanço das chances de uma 'mudança de regime' à direita. Esses ativos também podem oscilar, mas em direção contrária, com a manutenção da defesa da soberania nacional, ênfase no discurso social  e crescimento de Lula nas pesquisas, ou com o prolongamento de um impasse na direita, o que pode incidir econômica e midiaticamente na campanha de reeleição do presidente".


(Reprodução/PR)

CENA ANTERIOR

Até recentemente, quando predominava a aposta na derrota do governo Lula, o mercado previa o início dos cortes da Selic entre dezembro deste ano e março de 2026. Porém, com a Faria Lima reconhecendo o favoritismo do petista, circulam avaliações de que o começo do ciclo de afrouxamento monetário pode ser adiado para o fim do primeiro trimestre ou início do segundo, em abril. Com a recuperação de Lula nas pesquisas, o mercado recalculou seu cenário-base para 2026. O megainvestidor Luis Stuhlberger descartou um “rali Tarcísio” e sinalizou uma proposta de acordo de transição fiscal: corrigir a previdência pela inflação a partir de 2027, ano em que o mercado projeta um “acerto de contas” fiscal, razão pela qual candidaturas e possíveis vencedores da corrida ao Planalto são incentivados a assumir o quanto antes essa "bandeira".

O ajuste defendido originalmente pela Faria Lima passa por uma reconfiguração estrutural do gasto público, retomando a agenda interrompida com o colapso do Teto de Gastos, há quatro anos, impulsionado pela pandemia de Covid-19 e avanço das emendas parlamentares impositivas formais e informais. O centro da pressão, portanto, está em submeter as políticas sociais a uma âncora fiscal dissociada do crescimento econômico e da taxação da alta renda, o que a oposição chama genericamente de "aumento de impostos".

 ESCOLHAS DE GALÍPOLO: GANHA-GANHA PARA LULA

"O BC vai precisar começar a baixar os juros (...) todo mundo sabe o que nós herdamos e que nós estamos preparando esse país para ter uma política monetária decente (...) os empresários que reclamam de nós têm praticamente R$ 500 bilhões de desoneração e isenção fiscal, e eles não querem baixar 1% disso", disse o presidente, durante o lançamento do programa Reforma da Casa Própria, na segunda-feira.

Nesse jogo de expectativa e narrativa, o ritmo da Selic pode se tornar um marcador da disputa entre dois projetos, mas com investidores e gestores assumindo o papel que caberia a jogadores como Tarcísio de Freitas. Se Gabriel Galípolo, presidente do BC, parece ter aceitado consensos herdados de Roberto Campos Neto para evitar uma crise de confiança, dificilmente repetirá a dose se Lula convencer a opinião pública de que pressões da Faria Lima para procrastinar a queda da Selic tem motivação eleitoral. E, se escolher repetir, reforçará o discurso de boicote.