A semana termina com a consolidação da anistia “light” no Congresso, que só pode mudar de rumo se Washington endurecer contra os chefes do Legislativo em resposta à condenação de Bolsonaro — novas sanções são esperadas para a próxima semana. O Centrão mira o ex-presidente inelegível e fora da Papuda para que possa apoiar, por ora, Tarcísio de Freitas, favorito do establishment econômico e político para 2026. Lula, por sua vez, aprovou tarifa de luz reduzida para famílias de baixa renda, avançando em sua agenda popular, e enviou ao Congresso regras para big techs que protegem menores e combatem práticas anticoncorrenciais, mas podem irritar a Casa Branca. O presidente ainda deve se beneficiar da tendência de queda dos juros no Brasil e nos EUA. No exterior, Milei aumenta gastos sociais para enfrentar o peronismo, enquanto super-ricos mexicanos atacam Sheinbaum para evitar pagamento de impostos. Confira nossa seleção.
Abaixo, a legenda para avaliação de risco político:
⬆️ Positivo para o governo Lula
⬇️ Negativo para o governo Lula
🟠 Atenção
(TV Câmara/Reprodução)
POLÍTICA
⬇️ Avança, mais uma vez, o roteiro da anistia
Com placar de reforma constitucional — 311 votos a favor e 163 contrários — a Câmara dos Deputados aprovou, à revelia do Palácio do Planalto, o requerimento de urgência do projeto que concede anistia a condenados e réus por tentativa de golpe de Estado. O presidente da Câmara, Hugo Motta, afirmou que um novo texto, a ser elaborado nos próximos dias, buscará contemplar a ampla maioria da Casa. Um relator deve ser indicado nesta quinta-feira. O resultado da votação confirmou o mapa da oposição de cerca de 300 votos pela anistia, enquanto o conteúdo usado para aprovar a urgência já prevê um perdão "amplo, geral e irrestrito". O líder do PT na Câmara, Lindbergh Farias, disse que a urgência abre espaço para a imposição de uma versão bolsonarista na hora do mérito.
🟠 Fiquei lá fora estacionando os carros
Integrantes do Centrão, liderados por Motta, costuraram em sigilo um acordo com ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) para votar um texto que permita que o ex-presidente Jair Bolsonaro cumpra pena em regime domiciliar (longe da Papuda, portanto), reduza penas e rejeite o perdão total dos crimes julgados pelo STF.
🟠 Um convite ao revanchismo
Hoje adversário do governo Luiz Inácio Lula da Silva, o deputado Paulo Pereira da Silva, líder histórico da Força Sindical, deve assumir a relatoria da anistia, mas com foco em reduzir penas. Recentemente, ele, que é visto como um interlocutor do STF, declarou-se contra a anistia e redução de pena dos envolvidos na tentativa de golpe.
⬆️ Entraves no Senado
O presidente do Senado, Davi Alcolumbre, informou que o relator da "PEC da Blindagem", uma etapa do roteiro da anistia, será designado pelo senador Otto Alencar, presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). Alencar afirmou que a proposta não avançará no colegiado, mas líderes do Centrão acreditam que a análise pode ser concluída nesta semana. Alencar garantiu que uma anistia "ampla, geral e irrestrita" não teria apoio suficiente na Casa.
⬆️ Não passará
Em entrevista à imprensa britânica, o presidente Lula prometeu vetar qualquer anistia que envolva o ex-presidente, mas reafirmou que a decisão cabe ao Parlamento, transferindo para os deputados o desgaste político e reforçando a independência dos Poderes. Sobre o apoio de parlamentares petistas à chamada "PEC da Blindagem", baseado em um "gesto amargo" ao Centrão para tentar barrar a anistia e destravar pautas populares do Executivo, Lula disse que, caso fosse deputado, votaria contra e defenderia fechamento de questão pela bancada do PT neste sentido. A PEC protege congressistas de investigações e punições do STF.
⬆️ Custo do "semiparlamentarismo"
Ministros do STF veem a “PEC da Blindagem” como porta aberta para facções criminosas entrarem nas assembleias legislativas dos estados. Em reação, o ministro Flávio Dino pediu à Procuradoria-Geral da República (PGR) e à Advocacia Geral da União (AGU) pareceres em três ações que questionam regras das emendas parlamentares, incluindo o fim do orçamento impositivo, considerado um risco fiscal e símbolo da apropriação de prerrogativas do Executivo pelo Legislativo. Para analistas, Hugo Motta pode acabar sendo visto como responsável por um inédito revés ao status quo do Congresso. Já o decano da Corte, Gilmar Mendes, pode construir um novo entendimento sobre impeachment de ministros do STF, reduzindo riscos diante de uma possível hegemonia contrária à Corte no Senado a partir de 2026.
⬆️ Pedindo pra sair?
O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, descartou disputar a eleição presidencial em 2026 para concorrer à reeleição ao Palácio dos Bandeirantes. Analistas indicam que seus movimentos pela anistia contribuíram para ele se fortalecer no estado, acenando para o eleitorado bolsonarista. O presidente do PSD, Gilberto Kassab, aliado de Lula e Tarcísio, tem defendido que o gestor paulista seria um presidenciável "imbatível" em 2030.
OPINIÃO PÚBLICA
⬆️ Verdade tropical
Visto como um termômetro do centro progressista e das classes médias democráticas, o cantor Caetano Veloso destacou a necessidade da população protestar contra a PEC e a anistia. "A PEC da bandidagem que é o que é: PEC da bandidagem, tem que receber da sociedade brasileira uma resposta saudável, socialmente saudável. Uma manifestação de que grande parte da população brasileira não admite um negócio desse. E ainda mais sendo, agora, às pressas, levada à frente esse projeto de anistia", declarou Veloso, em suas redes sociais. Grupos influentes na opinião pública, considerados porta-vozes do establishment "liberal na política e na economia" — como Globo, também se manifestaram contra as duas propostas.
⬆️ Esperança equilibrista
Pesquisas desta semana — Datafolha, Quaest e AtlasIntel — mostraram estabilidade na popularidade de Lula, suficiente para renovar seu leve favoritismo para 2026. Os levantamentos também apontaram desvantagem política do clã Bolsonaro, tanto na disputa presidencial quanto em temas como anistia, prisão do ex-presidente e sua associação à tentativa de golpe. Especialistas, como Felipe Nunes, da Quaest, avaliam que a pulverização de candidaturas oposicionistas pode dificultar a formação de uma frente única contra o presidente, o que poderia levá-lo à vitória já no primeiro turno. Essa visão, porém, destoa da maioria dos analistas. No começo do mês, Christopher Garman, diretor-executivo para as Américas da Eurasia Group, previu um cenário de 50%-50%, com viés pró-Lula.
ECONOMIA
⬆️ Redução dos juros no horizonte
O Banco Central (BC) manteve a taxa Selic em 15% ao ano, em linha com as previsões do mercado, um dia após o Federal Reserve cortar 0,25 ponto percentual nos juros dos Estados Unidos. Economistas da Faria Lima avaliam que o início da flexibilização monetária pode ocorrer no primeiro semestre de 2026, com valorização do real frente ao dólar e redução da inflação favorecendo cortes futuros na Selic e criando um cenário positivo para as chances de reeleição de Lula. Para o BTG, de André Esteves, o tarifaço americano não tirou o otimismo dos investidores brasileiros.
⬆️ "A velocidade terrível da queda"
O banco JP Morgan projeta que a Selic pode começar a cair a partir de dezembro, chegando a 10% em 2026. O presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Ricardo Alban, defende o início dos cortes em novembro. O JP Morgan destacou que a B3 pode liderar ganhos na América Latina com o ciclo de cortes do banco central americano. A previsão considera a estabilidade institucional do governo Lula e as apostas de vitória de um candidato de direita em 2026. De acordo com os gestores ouvidos pelo BTG, no entanto, a possibilidade de mudança de grupo político no Planalto está longe de estar precificada.
⬆️ Dia de euforia
O Ibovespa subiu 1,06%, fechando aos 145.594 pontos, na chamada “super quarta”, enquanto o dólar encerrou em alta de 0,06%, cotado a R$ 5,3012. A expectativa de cortes de juros nos EUA e de manutenção no Brasil já vinha impulsionando a Bolsa e pressionando o dólar para baixo nos últimos dias. Em paralelo, o governo comemorou a aprovação da Medida Provisória (MP) da tarifa social de energia, que reduz a conta de luz de famílias de baixa renda, avançando em sua sustentação social.
⬆️ Soberania digital à espera da Casa Branca
O presidente Lula enviou ao Congresso Nacional o projeto de regulação das big techs, que busca combater práticas consideradas anticoncorrenciais de Amazon, Apple, Google, Meta e Microsoft. Lula sancionou ainda a lei contra a “adultização” de crianças nas redes sociais e editou uma MP para que as regras entrem em vigor em seis meses, e não em doze. Outra medida assinada pelo presidente institui a Política Nacional de Data Centers, com isenção de impostos para equipamentos importados e estímulo à exportação de serviços. A meta é tornar o Brasil mais competitivo em infraestrutura digital, reduzindo custos e atraindo investimentos. Empresas beneficiadas terão de cumprir exigências de sustentabilidade.
⬆️Um novo tempo
Segundo a Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan), 2024 foi o melhor ano de gestão fiscal para os municípios brasileiros, impulsionado pelo crescimento de 3,4% do PIB, que aumentou a arrecadação pública.
INTERNACIONAL
⬆️ Flerte com o "populismo"
Após perder a eleição na Província de Buenos Aires e a 40 dias de uma votação nacional que renovará o Congresso, Javier Milei reduziu o tom de sua agenda de cortes, conhecida como “motosserra”. O presidente argentino afirmou que “o pior já passou” e anunciou que, em 2026, vai ampliar os investimentos em aposentadorias, saúde e educação – setores duramente atingidos por sua política de austeridade fiscal e centro das manifestações populares que desafiaram seu governo nos últimos meses e, possivelmente, levaram Milei à derrota. O novo curso, ironicamente, teve recepção positiva no mercado, na medida em que pode contribuir para a derrota do peronismo nas eleições.
🟠 Super-ricos vs. Sheinbaum
No México, o empresário Ricardo Salinas, o homem mais rico do país, lançou uma campanha contra a presidenta Claudia Sheinbaum, acusando-a de liderar um “governo comunista, criminoso e corrupto”. Salinas, dono de um conglomerado de mídia e varejo, é acusado de sonegar US$ 4 bilhões em impostos.
🟠 "Conhecereis a verdade e a verdade vos libertará"
Nos EUA, o presidente Donald Trump anunciou que designará o movimento Antifa como organização terrorista e abrirá investigações sobre o financiamento do grupo. Em rede social, Trump chamou o movimento de “desastre da esquerda radical” e “doente e perigoso”. O Antifa surgiu na Alemanha nos anos 1930 como resistência ao nazismo de Adolf Hitler e hoje está presente em vários países, incluindo os EUA, onde participa de protestos contra grupos de extrema-direita. Segundo Lula, o comportamento de Trump "é muito ruim para a democracia", pois "tem apoiado pessoas antidemocráticas no mundo inteiro". O ex-presidente americano, Barack Obama, alertou que pode estar em curso uma crise sem precedentes no país.
🟠 Mares de sangue
O ministro das Finanças de Israel, Bezalel Smotrich, de extrema direita, disse que a Faixa de Gaza é uma potencial "mina de ouro" imobiliária e que está em negociações com os EUA para dividir o território costeiro após a guerra. Em fevereiro, Trump disse que os americanos tomariam Gaza para transformá-la na "Riviera do Oriente Médio". Para internacionalistas, Smotrich sugere a intenção por trás do que países como Brasil e África do Sul denunciaram à Corte Internacional de Justiça, em Haia, como genocídio da população palestina. Para analistas, como Pedro Dória, do Canal do Meio, denunciar o governo Benjamin Netanyahu "é parte da luta contra antissemitismo".