Nesta semana, as atenções se voltam para a conversa entre os presidentes brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, e o americano, Donald Trump. A expectativa é que, em algum momento, esse diálogo abra caminho para um novo acordo tarifário entre os dois países e para o relaxamento de sanções contra autoridades do Brasil. O formato remoto reduz o risco de um eventual constrangimento de Trump a Lula — e, caso ocorra, tende a favorecer o presidente brasileiro como a parte desrespeitada. Entretanto, um mal-estar é considerado improvável se o lobby da empresa JBS foi mesmo determinante para o distensionamento entre Washington e Brasília.
Se algum alívio nas sanções ao Brasil for obtido já neste primeiro encontro, o Supremo Tribunal Federal (STF) pode se sentir confortável em adotar postura semelhante em relação ao ex-presidente Jair Bolsonaro. Um relaxamento nas sobretaxas, por sua vez, deve beneficiar a valorização da Bolsa e do real frente ao dólar, criando condições para o crescimento de um clima mais otimista no país, em convergência com a — por ora — tendência baixista dos juros a partir do início do ano que vem, na esteira da recuperação estável da popularidade de Lula. Cientistas políticos, contudo, recomendam cautela quanto à expectativa de resultados imediatos.
(Fundação Perseu Abramo/Reprodução)
COM IR, LULA DEVE AMPLIAR OFENSIVA
No cenário doméstico, o Palácio do Planalto e o PT vão mobilizar a opinião pública pela aprovação da reforma do Imposto de Renda (IR), agenda "picanha e cerveja" prioritária do governo Lula e apoiada por cerca de 70% da população. O zeitgeist no Executivo é de que “a dosimetria que interessa é a tributação dos super-ricos”, em sintonia com manifestações populares e pesquisas recentes. Esses levantamentos indicaram que o lulismo conseguiu se reapropriar do sentimento antissistema latente na sociedade e ampliar sua posição no eleitorado de centro e de classe média, explorando sua face outsider — ou de alternância efetiva de poder no país, ainda que no exercício do governo.
Para evitar novo desgaste, o presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta, confirmou a votação da reforma do IR para quarta-feira, rejeitando qualquer vinculação com o “PL da Dosimetria”, rebranding da anistia. A ameaça do relator, deputado Paulo Pereira da Silva, de que, sem apoio do PT, a versão ampla pode conquistar o aval do Centrão soa como mais um pretexto para que o bloco compartilhe com o Planalto o ônus da dosimetria e o bônus político da reforma do IR, depois do revés da "PEC da Blindagem".
ANISTIA COM CENTRÃO ENFRAQUECIDO
Na atual correlação de forças — com o Centrão em xeque e poder restrito à Câmara — nem mesmo uma proposta de redução de penas que beneficie Bolsonaro teria vida fácil no Senado, o que tornaria qualquer tentativa de aprovar um texto mais radical apenas um gesto de demarcação política. No entanto, a combinação entre o aumento da faixa de isenção total do IR de R$ 5 mil para R$ 7 mil, proposto em emenda do relator "Paulinho da Força", e um substitutivo do PL garantindo anistia ampla, capaz de agradar ao expressivo eleitorado de direita, é vista com potencial para tirar do corner a aliança Centrão-bolsonarismo — mesmo que a blitzkrieg não prospere no Senado nem no STF.
Paralelamente, cresce a pressão de setores de centro e direita para que o deputado Eduardo Bolsonaro aceite um pacto que manteria o pai inelegível, porém em prisão domiciliar — solução que o próprio ex-presidente estaria disposto a aceitar, ajudando a viabilizar a candidatura presidencial do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas. Nesse contexto se inserem a suposta desistência de Tarcísio de disputar a Presidência em 2026, as notícias que apontam Ratinho Jr. como plano B do Centrão, o possível adiamento da votação do “PL da Dosimetria” para depois desta semana e o avanço do processo que pode levar à cassação de Eduardo. Os movimentos do deputado, entretanto, indicam que ele está mirando o futuro da direita ideológica e cultural.
UM PALCO ARMADO
Uma eventual capitulação do clã Bolsonaro poderia ser interpretada como derrota por sua base mais fiel, abrindo espaço para novas lideranças. Essa mesma base foi a que manteve apoio irrestrito ao ex-presidente durante a pandemia de Covid-19, sendo vista como garantia de que um nome indicado por ele chegaria ao segundo turno.
Todavia, Tarcísio visitará Bolsonaro e, embora negue a intenção, o palco está preparado para um anúncio que pode reanimar o establishment político e econômico — mas também favorecer um ambiente mais positivo para a conversa Lula-Trump. Assim, a tendência neste início de semana é novamente favorável ao Planalto, que também vem acumulando os pontos das operações contra lavagem de dinheiro do crime organizado na economia formal — como na Faria Lima, que atingem o coração dessas máfias sem disparar tiros e martirizar comunidades.
AGENDA DA SEMANA: NOSSOS DESTAQUES
Na segunda-feira, além do Boletim Focus com as expectativas do mercado financeiro sobre a economia brasileira, saem os números oficiais de emprego formal, que têm batido recordes. O Banco Central (BC) disse que seguirá atento aos impactos do período eleitoral sobre inflação, câmbio e juros futuros, com a Faria Lima recalculando as chances de vitória da centro-direita em 2026 — o que pode gerar pressão de alta no dólar e nos juros e baixa na Bolsa conforme o progresso do ciclo eleitoral. . Esse movimento pode afetar as perspectivas de queda da Selic, já sob questionamento pela resiliência da atividade econômica, mas a previsão ainda é de início de cortes em janeiro. Sairão também os dados do IGP-M, termômetro de inflação.
No campo político, Lula abre a 5ª Conferência Nacional de Políticas para Mulheres, em Brasília. No Senado, a "CPI do INSS" ouve mais envolvidos em fraudes contra aposentados, mas segue sem produzir escândalos agendáveis. No Judiciário, Edson Fachin e Alexandre de Moraes tomam posse como presidente e vice do STF, sinalizando maior autocontenção da Corte, o que pode favorecer negociações Lula-Trump e reforçar a estabilidade institucional, sem abrir mão de firmeza nas relações com o Congresso.
Na frente eleitoral, Tarcísio pode anunciar o apoio de Bolsonaro à sua candidatura presidencial, em troca de aceitar prisão domiciliar e inelegibilidade, o que pode levar a Câmara a pautar o "PL da dosimetria". O senador Flavio Bolsonaro garantiu que o vice de Tarcísio será da família.
Na terça-feira, o governo divulga o balanço orçamentário, com atenção à meta fiscal, cuja margem inferior foi rejeitada como objetivo legal pelo Tribunal de Contas da União (TCU), enquanto parlamentares buscam garantir o pagamento das emendas antes das eleições. As emendas seguem sob escrutínio do STF e com rejeição na opinião pública. Na Câmara, o Conselho de Ética abre processos de cassação contra deputados que participaram do motim bolsonarista de agosto. No Senado, a comissão mista da Medida Provisória (MP) do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) vota o relatório do deputado Carlos Zarattini, taxando a renda alta para fechar as contas do arcabouço fiscal. A MP do Plano "Brasil Soberano", com apoio a setores afetados pelo tarifaço, será debatida em audiência com ministros. O Plenário do Senado deve aprovar a regulamentação da reforma tributária, avançando na pauta econômica lulista.
Na quarta-feira, a Câmara vota a reforma do IR, também com viés de aprovação, liberando mais dinheiro popular para "picanha e cerveja", mas também para quitar dívidas e investir na Bolsa. O Senado segue com audiências sobre o Plano "Brasil Soberano" e instala a Frente Parlamentar em Defesa das Terras Raras, que pode produzir, no futuro, subsídios para as tratativas entre Casa Branca e Planalto.
O STF pode julgar ações sobre vínculo entre motoristas e aplicativos, decisão que afetará o mercado de trabalho e pode impulsionar os debates sobre o fim da escala 6x1. Na semana passada, o ministro do Trabalho, Luiz Marinho, afirmou que o avanço da medida depende de pressão da sociedade.
Na sexta-feira, a atenção se volta ao payroll americano, indicador que pode redefinir expectativas globais de juros. No Brasil, a divulgação da produção industrial e dos serviços será chave para calibrar projeções de inflação e cortes da Selic. Bancos da Faria Lima projetam Selic de um dígito em caso de enfraquecimento na geração de empregos, desaceleração dos serviços e um ajuste fiscal que desvincule um salário mínimo congelado de benefícios sociais, combinado com o fim dos pisos da educação e saúde. Em mais uma reviravolta surpreendente da política, a 1ª Turma do STF, presidida por Cristiano Zanin, começa a julgar o ex-juiz da Lava Jato, senador Sergio Moro, acusado de caluniar Gilmar Mendes.