Por: Leopoldo Vieira e Machado da Costa*
As articulações para que o Congresso vote o projeto de anistia aos réus de 8 de janeiro — medida que pode beneficiar diretamente o ex-presidente Jair Bolsonaro — devem ganhar força nesta semana. O texto, que já teve o regime de urgência aprovado para apreciação em plenário, está sendo moldado para livrar Bolsonaro da prisão (ou ao menos da Papuda), mantendo-o inelegível. Segundo parlamentares envolvidos nas negociações, a proposta incluiria uma tentativa de envolver o Supremo Tribunal Federal (STF) no acordo.
A avaliação dominante no Congresso é que a oposição “raptou” a pauta legislativa após a obstrução das votações na semana passada. O bloqueio ocorreu em meio ao impacto político da entrada em vigor do tarifaço americano sobre exportações brasileiras e às reiteradas demonstrações do governo Donald Trump de que não recuará enquanto não cessarem os processos contra Bolsonaro e as chamadas big techs.
Para ir a voto nos próximos dias — possivelmente acompanhada de propostas que buscam blindar parlamentares contra o STF —, a anistia deve contar com apoio de líderes de Republicanos, PP, União Brasil, PSD e PL. O presidente da Câmara, Hugo Motta, disse que seguirá a decisão do colégio de líderes, que se reúne nesta terça-feira, sinalizando não se opor à articulação. A medida seria incluída em um pacote de autoproteção parlamentar, mesmo após Motta ter encaminhado à Corregedoria da Casa nomes de 14 deputados para possível punição pelo bloqueio da semana passada.
Nos cálculos preliminares de articuladores, a anistia teria maioria no plenário, mesmo com o risco de ser declarada inconstitucional pelo STF. A expectativa é que a pressão americana sobre as instituições brasileiras aumente na sequência, o que poderia acelerar a tramitação. Vale lembrar que autoridades como o presidente do Senado, Davi Alcolumbre, o próprio Hugo Motta e o ministro Gilmar Mendes, do STF, estão na mira de possíveis sanções da Lei Magnitsky — que, como já afirmaram grandes bancos brasileiros, incluindo o Itaú Unibanco, será cumprida pelo sistema financeiro nacional.
No plano político, o Centrão pressiona Bolsonaro a antecipar a escolha do nome da direita para 2026. Segundo aliados, no entanto, o ex-presidente vem reduzindo a confiança no governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, favorito do bloco e da Faria Lima. A informação, repassada ao mercado na sexta-feira por fontes bolsonaristas, provocou reação imediata: queda na bolsa e alta do dólar, movimento semelhante ao da semana anterior, quando pesquisa Quaest indicou recuperação parcial da popularidade do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Tarcísio terá almoço com grandes investidores no próximo sábado, ocasião em que sua candidatura e a anistia a Bolsonaro provavelmente estarão na pauta. O cenário da Nova Guerra Fria e a força eleitoral do clã Bolsonaro — capaz de levar um nome da família ao segundo turno com apoio explícito de Trump — podem aproximar gradualmente Centrão e Faria Lima de postulantes como Michelle Bolsonaro ou o senador Flávio Bolsonaro, líderes nas apostas para uma candidatura “familiar”.
Se Bolsonaro optar por Tarcísio, a consequência pode ser a saída antecipada de Republicanos, PP, União Brasil, PSD e MDB da Esplanada dos Ministérios. A centro-direita marcharia unida pela anistia e contra o PT em 2026, com respaldo do mercado financeiro e beneplácito do governo americano.
(Reprodução/Facebook)
Enquanto isso, o governo Lula tenta furar o cerco e prepara o anúncio de apoio a setores atingidos pelo tarifaço — prioridade que, segundo Motta, terá espaço na pauta da Câmara. Porém, o secretário do Tesouro dos EUA, Scott Bessent, cancelou a reunião virtual marcada para quarta-feira com o ministro da Fazenda, Fernando Haddad. Segundo o próprio ministro, o cancelamento teria relação com a atuação do deputado Eduardo Bolsonaro.
Em nota, o parlamentar afirmou que qualquer encontro entre os governos brasileiro e americano será “mera encenação” e “inútil” enquanto o Brasil não enfrentar as razões apresentadas por Trump — sugerindo, mais uma vez, a empresários, investidores e políticos que tem mais influência no assunto do que o próprio ministro da Economia.
No horizonte legislativo, ainda sem data para votação, está também a proposta de isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil. O relator é o ex-presidente da Câmara Arthur Lira, o mesmo que costurou o acordo para encerrar o bloqueio do Congresso e abrir caminho para que o establishment atravesse a rua da soberania rumo à anistia.
* Jornalista especializado em economia, com 20 anos de experiência em comunicação e trajetória na Agência Estado, Folha de S.Paulo e na revista Veja, como editor de Economia e criador da coluna Radar. Também foi sócio na Helix Desenvolvimento de Softwares e fundou a AIP Consultoria, onde desenvolveu estratégias para grandes empresas como Suzano Papel e Celulose, Ultragaz, Neoenergia e Refit.